18 de janeiro de 2018

Investidor estrangeiro ignora crise fiscal e investe no Brasil

O novo pico da Bolsa brasileira, acima dos 81 mil pontos, mostra que o mercado se descolou da questão política




Perda de atratividade da renda fixa, com recuo dos juros, estimulam investidores estrangeiros a procurar a Bolsa

O novo pico da Bolsa brasileira na quarta (17), fechando pela primeira vez acima dos 81 mil pontos, mostra que o mercado se descolou da questão política. Desde o começo do ano, o Ibovespa vem batendo recordes por causa da expectativa de crescimento do lucro das empresas este ano, pelos bons números da economia, que apresenta juros e inflação baixos, recuperação lenta do emprego e também do crédito. Além dos fatores domésticos, a expansão da atividade mundial contribui com as altas, criando uma oportunidade a mais para o crescimento dos negócios no Brasil. O investidor estrangeiro está capitalizado e quer investir seus ganhos, ignorando, inclusive, a grave crise fiscal que afeta o País.

Em entrevista ao jornal Valor Econômico, especialistas em ações CM Capital Markets informaram que os estrangeiros investiram R$ 8,12 bilhões em ações brasileiras nos últimos 21 pregões.

Para Renato Ometto, sócio de renda variável da Mauá Capital, um fator que estimula a entrada dos estrangeiros na Bolsa é o menor retorno dos produtos de renda fixa que, por causa dos juros baixos, perderam a atratividade. “Antes eles eram atraídos pelo grande rendimento gerado pela inflação. Com os juros diminuindo, o pessoal busca outros instrumentos para ter rentabilidade superior. Com o risco país, o investidor passa a ponderar e há um fluxo positivo para a Bolsa e (o investidor) sai da renda fixa”, diz. Ele pondera que não se trata simplesmente de uma rotação de capital, já que não são exatamente os mesmos investidores que saem da renda fixa em busca da renda variável.

RETOMADA

O mundo experimenta uma fase de expansão da atividade econômica. Esse ciclo recomeçou após o baque de 2008 estagnar a economia por dois anos. Para reativar os motores, os bancos centrais ao redor do mundo passaram a atuar para injetar dinheiro na economia e reduziram os juros. A economia americana, motor da atividade mundial, passou a reagir melhor e mais rápido que a de outros países, principalmente em relação à Europa, que ficou encalacrada com as crises de seus países, sendo a Grécia o maior expoente negativo.

O reaquecimento da economia americana, aliás, vem acompanhado de um fenômeno novo. De passagem por Miami, de onde falou ao JC, o executivo do Grupo L&S Alexandre Wolwacs diz que o crescimento dos EUA vem acompanhado do pleno emprego. “O que chama atenção nisso é que a inflação acontece naturalmente com o pleno emprego. E isso não está ocorrendo nos Estados Unidos, que registra aumento no número de emprego, e, ao mesmo tempo, a inflação não sobe. Isso tem sido apontado por vários especialistas como um efeito estranho, e para a maior parte dos analistas isso acontece porque a melhoria tecnológica tem reduzido o valor do produtos, que estão cada vez mais baratos”, observou. “Isso reflete, em última análise, nos juros. Como não tem inflação, os juros tendem a permanecer baixos, e isso também é positivo pra o Brasil.”

Os problemas fiscais da Grécia, Espanha e Portugal atrasaram a retomada no velho continente, mas a partir de 2014 começaram os sinais de recuperação. Recentemente, a China voltou a registrar “crescimento chinês”, e surpreendeu em 2017 ao fechar seu PIB acima das expectativas de mercado: 6,8%. O resultado das boas performances podem ser lidos nos ganhos das principais bolsas mundiais.

REFORMAS

Todo esse cenário mundial positivo que puxa o mercado brasileiro, no entanto, pode ser desperdiçado caso o País deixe de lados as reformas. “A gente perdeu a janela de oportunidade da retomada mundial porque estávamos resolvendo os problemas da nova matriz econômica (governo Dilma). Agora, a gente está vendo uma nova janela, mais positiva ainda. Acredito que estamos num bom momento, desde que façamos o dever de casa”, avalia Osvaldo Moraes, sócio da Multinvest Capital. O dever de casa se chama reforma na Previdência, para melhorar o ambiente fiscal, e a reforma tributária, que melhoraria o ambiente de negócios. Para ele, a questão fiscal é uma âncora que puxa o País para baixo. “Temos uma carga tributária muito grande, as empresas ficam presas na complexidade do cálculo dos tributos no Brasil, é PIS, Cofins, ISS, IR... E cada Estado com o seu ICMS.”

Apesar das dificuldades, Moraes salienta que o Brasil é um País muito atrativo ao investidor estrangeiro porque tem um mercado consumidor grande, maior que a Coreia do Sul. É uma nação de pessoas mais jovens em relação a países como o Japão, politicamente mais organizado que a Índia – que ainda possui castas – e vive uma democracia, diferente da Rússia, por exemplo. “O México deixou de ser oportunidade por causa de Trump. Somos quase a bola da vez. Precisamos atrair investidores para melhorar a infraestrutura e logística. Os chineses têm interesse nisso, o investidor de longo prazo quer isso”, avalia.

Wolwacs lembra da importância da eleição deste ano para que o Brasil possa aproveitar os bons ventos que sopram de fora. “A gente tem que pensar quem será a próxima equipe econômica e sua linha ideológica. Se continuarmos no caminho pelo desprezo ao superávit fiscal, mesmo com economia mundial favorável, a gente pode perder um novo cavalo selado. Os ventos estão favoráveis, mas a gente tem que levantar as velas. Não adianta ter só a economia mundial colaborando. A gente tem que fazer o dever de casa: melhorar a infraestrutura, a logística e a questão fiscal.”

Fonte: Estadão

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